Produto sustentável é capaz de alimentar uma lâmpada por três horas com geração de energia, além de estimular atividade física
Por Danilo Moreira
Em um mundo cujas práticas mais sustentáveis e a busca por fontes renováveis de energia são cada vez mais necessárias, uma invenção genial une esses conceitos e um dos esportes mais populares do mundo para ajudar locais carentes de iluminação. Trata-se da Soccket, uma bola de futebol que gera energia elétrica ao ser usada na prática do esporte. Isso é possível graças a um mecanismo acoplado que funciona como um motor, que ao entrar em movimento, captura a energia cinética e a transforma em eletricidade. Os pontapés dados em 15 minutos de jogo são capazes de alimentar uma lâmpada de LED por três horas. O invento foi criado nos Estados Unidos pelas estudantes universitárias Jessica Matthews e Julia Silverman.
Inicialmente, ambas eram alunas de Ciências Sociais na Universidade de Harvard (EUA). No final de 2008, as duas inventoras se matricularam em uma aula de Engenharia para não engenheiros na mesma instituição. Na ocasião, o professor desafiou a dupla a criar algo que pudesse combinar arte e ciência, com o objetivo de resolver um problema global. As jovens desenvolveram uma solução interessante que possibilitava unir a paixão pelo futebol e a geração de energia para populações carentes.
A instituição forneceu apoio financeiro durante os primeiros testes, e o restante foi aplicado por meio de recursos próprios nos quatro anos seguintes até chegarem a uma versão do produto na qual fosse possível a produção em massa. Essa visão da utilidade social da invenção e a ideia de unir futebol à geração de energia vieram por conta de uma vivência pessoal. Jéssica é descendente de nigerianos e conta que ao visitar o seu povoado de origem percebeu o quanto a prática do esporte influencia positivamente seus praticantes e, portanto, pode ser concebido como agente transformador em comunidades como essa e em países em desenvolvimento de modo geral.
A ideia parecia interessante, mas inserir tecnologia em uma bola e fazer com que ela se movimentasse não era uma ideia fácil. Ao consultarem engenheiros da Universidade e também do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), as inventoras foram informadas de que isso era impossível. A história poderia ter se encerrado neste momento, mas as garotas não desanimaram e passaram a se dedicar em buscar meios para que a invenção se tornasse realidade. Em um dos experimentos, as estudantes instalaram uma lanterna em uma bola para hamster, cuja bateria recarregava por meio de vibração. O equipamento foi chacoalhado e o movimento acendeu a lâmpada. O conceito então foi aplicado em uma bola de futebol.
O nome Soccket vem da junção das palavras inglesas “soccer” (futebol) e “socket” (conector de tomada). A bola possui um pêndulo de zinco, responsável por captar energia do movimento dos chutes. A peça roda acoplada a um gerador conectado a uma bateria de Li-on que realiza o armazenamento da carga. Já a carcaça da bola é feita de plástico e espuma EVA reciclável. Por conta dos componentes internos, o produto pesa cerca de 30 gramas a mais do que uma bola convencional. Após carregada, basta acoplar a Soccket a uma lâmpada de LED que acompanha o produto e posicionar a bola como se fosse o apoio de um abajur. A tecnologia é patenteada pela Uncharted Play, empresa criada pelas estudantes em 2011 para administrar, comercializar e gerenciar a invenção.
O protótipo foi levado a outros países para ser testado por crianças que jogam futebol. Comunidades de diversos locais como Nigéria, África do Sul e Brasil receberam o invento para ser utilizado em brincadeiras nos campos, playgrounds e lajes. Foram escolhidas áreas onde o esporte é popular e possuem deficiências na infraestrutura, em especial no que diz respeito à eletricidade.
A ideia deu certo e fez sucesso. O projeto se expandiu para outros países como El Salvador, Haiti, Libéria, Espanha e México. Atualmente, a Uncharted Play conta com doações de empresas privadas e ONGs que ajudam na distribuição do produto por comunidades carentes pelo mundo.
A primeira unidade da Soccket foi vendida em 2010 por meio do site de crowdfunding Kickstarter. O projeto recebeu apoio de personalidades como os presidentes Bill Clinton e Barack Obama, o ator Ashton Kutcher e o empresário Bill Gates. A startup também conseguiu meio milhão de dólares por meio de financiamento coletivo para fabricar pelo menos 50.000 bolas para distribuir em países como Costa Rica, El Salvador, Honduras, Nigéria, Tanzânia, África do Sul e Estados Unidos. Após o lançamento, a bola recebeu aprimoramentos e está em sua segunda geração. Ganhou reforço no material com uma proteção para não murchar, resistência à água e uma capacidade mais elevada para gerar energia elétrica com apenas 10 minutos de jogo.
A inventividade da startup não parou por aí. A empresa também trabalha no desenvolvimento de uma corda de pular, chamada Pulse, que assim como a Soccket, também gera energia por meio do movimento. A cada salto, a pressão exercida na alça faz com que a energia cinética seja acumulada. Após o uso, o usuário pode conectar um adaptador ao equipamento para transferir a carga armazenada para dispositivos eletrônicos pequenos como tablets e smartphones. A Pulse é feita com plástico durável e suas alças são feitas em impressoras 3D, que funcionam como dínamos. Outros produtos a serem desenvolvidos com os mesmos princípios são um skate e uma bola de futebol americano.
Mais do que uma questão de infraestrutura, ter eletricidade em casa possibilita às famílias, principalmente às crianças, maior produtividade em afazeres como os estudos e outras atividades que contribuem para o desenvolvimento cognitivo, intelectual e criativo. Segundo Jéssica, atualmente 1,3 bilhão de pessoas no mundo não tem acesso à energia elétrica. Por este motivo tecnologias como a bola Soccket podem fazer a diferença e contribuir para ajudar na diminuição dessa triste realidade. Outra vantagem dessas invenções criativas é a união de uma forma sustentável de geração de energia com o incentivo à prática de atividade física, tão importante para a saúde e o desenvolvimento humano. Durante sua palestra no TEDxRIO+20 em 2012, Jéssica reforçou a importância de unir diversão e iniciativas sustentáveis – o que ela afirma ser o norte de tudo que a empresa desenvolve. “Ouso dizer que a sustentabilidade não só pode como deve ser divertida. Primeiro, porque se as coisas são divertidas, as pessoas as aceitam melhor e, dessa forma, é provável as façam e continuem fazendo no futuro”, explica.
Para conhecer mais sobre a Soccket, clique neste vídeo explicativo (em inglês). Você também pode assistir à palestra de Jessica Matthews no TEDxRio+20 em 2012 por meio deste link.
Com informações de: Hypescience, O Estado de S. Paulo, Razões para Acreditar, Exame, Ciclo Vivo
Fotos: Divulgação