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Estudantes criam canudo que detecta 'Boa Noite, Cinderela'

Canudo muda de cor ao identificar substâncias que costumam ser adicionadas em bebidas que dopam vítimas

Por Danilo Moreira

Infelizmente ainda é muito comum ler notícias de roubos, abusos sexuais e outras violências, cujas vítimas acordam sem se lembrarem de nada e descobrem que caíram no golpe popularmente conhecido como “Boa Noite, Cinderela”. Seja em baladas, bares e outros locais públicos, o golpe ainda faz vítimas, principalmente mulheres. Normalmente, os criminosos se aproveitam da distração da pessoa e inserem drogas em uma bebida a ser consumida. A vítima consome a bebida associada com a substância (sem que saiba), acaba entorpecida e vulnerável ao controle do outro, já que está temporariamente inconsciente ou incapaz de reagir, e se torna sujeita, por exemplo, a sofrer violência sexual e/ou ter seus bens e pertences roubados.

Para ajudar a combater esse abuso, três estudantes de Miami, na Flórida (EUA) criaram um canudo que previne o “Boa Noite, Cinderela”, pois ajuda a identificar a presença de entorpecentes nas bebidas por meio da mudança de cor no momento em que entram em contato com as substâncias . Victoria Roca, Susana Capello e Caroline Baigorri são alunas do Ensino Médio do Gulliver Preparatory School, e criaram o projeto para um trabalho em uma aula de empreendedorismo.

O canudo funciona da seguinte forma: o objeto é colocado em contato com a bebida adulterada e detecta drogas que costumam ser utilizadas nestes casos: a Flunitrazepam (Rohypnol), a Cetamina (Special K) e a GHB (ácido gama-hidroxibutírico) – esta última a mais utilizada. Ao ter contato com as substâncias, o canudo muda de cor, de branco para um azul intenso.

As mulheres são as maiores vítimas do “Boa Noite, Cinderela” e este fato foi o que motivou as alunas inventoras a desenvolverem o projeto. Em entrevista ao programa de televisão “Inside Edition”, Victoria contou que o grupo realizou uma pesquisa sobre o assunto e descobriu que muitas vezes, mulheres eram vítimas não só de estupro, mas também do trafico humano. "Nosso desejo é apenas para ajudar as pessoas a se sentirem seguras, estarem cientes do que está acontecendo e saberem que o que estão bebendo é seguro", explica Susana.

De acordo com o Bureau of Justice Statistics, agência do governo americano especializado em dados de criminalidade no país, crimes envolvendo o “Boa Noite, Cinderela” costumam acontecer principalmente com mulheres entre 16 e 24 anos, especialmente universitárias que participam com mais frequência de eventos com consumo de álcool e drogas, o que aumenta o risco de alguém mal intencionado se aproveitar da situação para inserir as substâncias nas bebidas. No Brasil, também vemos frequentemente notícias de que criminosos aplicam o golpe em locais públicos como terminais rodoviários, lanchonetes, bares e até residências, onde o(a) morador(a) é enganado(a) e acaba por permitir a entrada de estranhos. Em geral, a vítima tem seus pertences roubados e suas contas bancárias esvaziadas.

As jovens inventoras pretendem desenvolver um novo canudo com um material biodegradável e já iniciaram o processo de obtenção de patente para comercializarem o produto, que contará também com uma campanha que será lançada em um site de financiamento coletivo. "Nós sabemos que não é uma solução definitiva, porque isso não acaba com o estupro, mas esperamos conseguir reduzir a frequência desse abuso e livrar meninas de situações em que possam ser fragilizadas dessa forma", afirma Caroline ao programa “Inside Edition”.

A criatividade dessas três alunas gerou uma invenção que pode ser um importante aliado no combate a um golpe que expõe a fragilidade humana e acontece no mundo todo. Certamente, além de representar uma medida de proteção, o canudo poderá ajudar a salvar vidas. É interessante percebermos e valorizarmos o fato de que muitas pessoas hoje criam soluções excelentes para os problemas cotidianos e que isto ocorre cada vez mais precocemente, como vemos nesta iniciativa das três jovens estudantes do Ensino Médio. Isso mostra que talentos pessoais podem tornar a vida uma experiência excepcional quando desfrutamos da capacidade inventiva que gera proteção e cuidado às pessoas.

Para saber mais sobre o canudo, veja o vídeo explicativo no final da matéria (em inglês).

Outras invenções

Em 2010, britânicos desenvolveram o batom Love 2 my Lips, com uma fita que ao ser inserida na bebida também muda de cor ao ter contato com substâncias adicionadas no líquido. Já em 2014, quatro estudantes de engenharia da Universidade da Carolina do Norte (EUA) desenvolveram um esmalte que mudava de cor em contato com uma bebida que continha as substâncias utilizadas no golpe, bastando colocar uma das unhas pintadas no copo. A empresa, chamada Undercover Colors, recebeu elogios pela iniciativa que poderia ajudar no combate a crimes como o estupro.

Apesar da boa repercussão, a Undercover Colors também enfrentou polêmicas na época, conforme relata o G1 e o Vix, principalmente no que diz respeito à violência contra a mulher e a forma como as sociedades tratam a questão do estupro. Segundo ativistas em prol dos direitos das mulheres e engajadas no combate ao estupro, o esmalte poderia levar à culpabilização da vítima, pois daria a falsa impressão de que mulheres poderiam por si só evitar os ataques e, caso fossem vítimas, seria considerado responsabilidade delas não terem evitado o crime.

Substâncias mais comuns no golpe

Os mais utilizados são o Ácido gama hidroxibutírico (GHB), Flunitrazepam e Cetamina (ou Ketamina). Estes dois últimos são medicamentos indicados para tratamentos específicos e são encontrados em forma de comprimidos ou gotas. Ao serem combinados especialmente com o álcool, alteram o nível de consciência da vítima, podendo causar danos ao organismo como intoxicação e até morte por desidratação. O efeito das drogas com essas combinações dura, em média, oito horas.

Veja abaixo mais detalhes sobre essas substâncias:

Flunitrazepam: conhecido como Rohypnol, é um medicamento indutor ao sono, utilizado como ansiolítico, anticonvulsivo e relaxante muscular. O remédio é proibido nos Estados Unidos por conta dos riscos no seu uso principalmente com álcool.

Ketamina: também chamado de Special K, é um anestésico de uso veterinário em forma de pó ou líquida. Em 1999, foi acrescentada à lista de substâncias controladas nos EUA devido ao seu uso em bebidas e cigarros, que pode gerar problemas como depressão, taquicardia, pressão alta, amnésia e dificuldades respiratórias, podendo levar à morte.

Ácido gama hidroxibutírico (GHB): conhecido como ecstasy líquido, chegou a ser utilizado como anestésico e hipnótico em humanos na Europa nos anos 1960, mas seu uso foi suspenso por conta dos efeitos colaterais como vômitos e convulsões. A droga ilícita costuma ser consumida para efeitos alucinógenos e é uma da mais utilizadas por criminosos para dopar as vítimas.

O que diz a Lei brasileira?

O “Boa Noite, Cinderela” é um golpe que leva a outros crimes como roubo e estupro de vulnerável. Se a vítima tiver bens subtraídos, entra no crime de roubo simples, tipificado no artigo 157 do Código Penal Brasileiro, classificado como roubo próprio com emprego de violência imprópria, ou seja, o criminoso emprega um meio que impossibilite a resistência ou defesa da vítima.

No caso de estupro, a finalidade do criminoso é inserir um tipo de droga na bebida ou vítima com o fim sexual, classificado como crime de estupro de vulnerável, tipificado artigo 217-A, §1º, parte final, do Código Penal Brasileiro. O estupro de vulnerável é crime hediondo.

Ambos os crimes são sujeitos à punição com reclusão de 4 a 10 anos (para roubo) e reclusão de 8 a 15 anos (no caso de estupro de vulnerável). Como este último é crime hediondo, o réu pode ter um maior período de cumprimento de pena para conseguir a progressão do regime.

Como se proteger do “Boa Noite, Cinderela”?

O “Boa Noite, Cinderela” pode acontecer em qualquer local onde um criminoso veja a oportunidade de adicionar uma substância na bebida que a vítima está consumindo, que pode ser desde alcoólica quanto um simples suco ou café. Apesar de mulheres jovens serem o tipo de população que mais sofre com esse golpe, idosos, empresários, turistas e outros perfis de pessoas também podem ser vítimas, tendo como alvo principalmente os seus pertences e contas bancárias.

A seguir, veja cinco dicas que te ajudam a se proteger do golpe:

1- Na balada, fique atento(a) ao barman enquanto ele prepara sua bebida e fique sempre com o copo em suas mãos.
2- Caso apoie o drinque em alguma superfície, não tire os olhos dele e evite deixá-lo ao alcance de outras pessoas. Caso desconfie que sua bebida foi alterada, na dúvida, é mais seguro pagar por outra.
3- Evite aceitar bebidas (alcoólicas ou não) de desconhecidos em quaisquer locais públicos.
4- Cuidado ao compartilhar informações pessoais e financeiras próximo a estranhos ou a pessoas que você conheceu recentemente, como em uma viagem, por exemplo.
5- Cuidado com pessoas que desejam entrar em sua casa alegando serem profissionais específicos, como agentes de saúde. Analise se estão devidamente uniformizados, com crachás ou apresentam outros sinais seguros de que são funcionários. Caso desconfie que seja uma pessoa mal intencionada, não permita que entrem em sua casa e denuncie às autoridades competentes.

É fundamental termos em mente que a responsabilidade no combate ao golpe do “Boa Noite, Cinderela” deve ser de todos, sobretudo de homens, e esta consciência deve ser estimulada em todos os ambientes coletivos e pelo Estado, que também deve fazer a sua parte na investigação e punição desses crimes que prejudicam toda a sociedade.

Com informações de: Só Notícia Boa, Estadão, Bored Panda, MRC-Cursos, Delas (IG), IdMed, Blog da Saúde, R7

Fotos: divulgação

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