Mousar Casanova
INTRODUÇÃO
O que você vai ser quando crescer? Provavelmente você não se recorda de quantas vezes esta pergunta foi feita na sua infância, adolescência e até mesmo na juventude, mas com certeza sabe que ela foi feita muitas vezes. Agora, você se recorda quais foram as respostas que você dava à essa pergunta? Vamos mais além, você sabe há quanto tempo você ouviu pela última vez essa pergunta?
E aí, difícil responder? Naturalmente que sim, são coisas do passado, certo? Errado! Provavelmente uma boa parte das nossas respostas tinham relação com aquilo que gostávamos de fazer, tinha a ver com nossas paixões. Mas, ao longo da nossa caminhada muitos de nós enveredamos por caminhos que foram escolhidos para nós.
A reflexão que fica dessa pergunta que parecia tão ingênua, continha na verdade, grande parte dos nossos sonhos como realização pessoal e profissional, mas que ao longo dos anos ela foi se esmaecendo até o ponto em que ela deixou de ser feita e desapareceu de vez, foi quando demos conta de que envelhecemos. A pergunta que nos ronda agora e que hesitamos em responder é: o que você deixou de ser quando envelheceu?
Mas, será que quando envelhecemos deixamos de sonhar? Será que não é hora de voltar àquela pergunta da infância e mudar o enfoque e tentar responde-la novamente? O que você quer ser quando envelhecer? Sim, está é a hora de refazer a pergunta sob uma nova perspectiva. Sabe por que? Porque quando ficamos velho não deixamos de sonhar!
Então junte-se a milhões de pessoas que estão vivendo esta nova fase da vida, o envelhecimento, dê uma sacudida no corpo, na cabeça e na alma e coloque mais ritmo dos seus sonhos, ainda tem muito chão nessa estrada. No Brasil, as pesquisas realizadas pelo IBGE apontam que o tempo de vida vem crescendo bastante. Nos últimos 40 anos, a projeção da vida de um brasileiro aumentou em 17 anos. Algumas estimativas sugerem que o brasileiro vá ultrapassar a barreira dos oitenta anos de idade por volta da década de 2030.
Gráfico 1
Brasil: Expectativa de vida da população (2000 a 2050)
Fonte: tabela projeção da população IBGE / <https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/projecao_da_populacao/2013/default_tab.shtm>
Elaborado por Mousar Casanova
Veja como os tempos mudaram, até a um tempo atrás na Roma Antiga, a expectativa de vida era em média de 30 anos e no período medieval quase metade dos recém-nascidos morriam. De lá para cá a expectativa de vida aumentou bastante porque ela está relacionada diretamente com o desenvolvimento de novos hábitos de higiene que a humanidade adquiriu, graças ao avanço da ciência, do saneamento e da conscientização das pessoas. Ausência de projetos de saneamento ou a falta hábitos de higiene, por exemplo, tem influência direta na expectativa de vida. Observe que no século XIV, a falta desses cuidados permitiu que quase um terço da Europa desfalecesse mediante a epidemia de Peste Negra. Na Alemanha do século XIX, a expectativa de vida de uma pessoa atingiu a surpreendente marca dos 37,2 anos de idade. Esse quadro só tomou outros rumos quando o cientista Louis Pasteur, na segunda metade do XIX, conseguiu provar a relação existente entre a contração de várias doenças e a higiene pessoal. Hoje, países desenvolvidos como Andorra tem uma expectativa de vida de 83,5 anos. Mas, nações menos favorecidas como Botsuana, tem uma expectativa de vida de 30,9 anos. O desenvolvimento de projetos sociais e econômicos interfere diretamente na variação desses índices.
O envelhecimento no Brasil acompanha o ritmo de um fenômeno mundial, os idosos com idade acima de 60 anos serão mais de dois bilhões até 2050 no mundo, será um quinto da população do planeta e no Brasil mais que o dobro apresentado pelo IBGE em 2018, 27,0 para 66,5 milhões.
Gráfico 2
Brasil: idade média da população (2000 a 2050)
Fonte: tabela projeção da população IBGE / <https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/projecao_da_populacao/2013/default_tab.shtm>
Elaborado por Mousar Casanova
Para entender melhor essa dinâmica demográfica no Brasil, Camanaro (2014), descreve a história em quatro grandes fases:
- Fase 1: Imigração (1872 – 1940)
Essa história começa em 1872, foi justamente nesse ano que acontece oficialmente o primeiro senso no Brasil, que abrange praticamente o final do século XIX e início do século XX. Nesse período a população apresentava tanto taxas de natalidade quanto taxas de mortalidade consideravelmente altas, portanto o crescimento vegetativo era relativamente pequeno. O incremento populacional acima de 2% a.a. se deu em função da imigração internacional, principalmente de italiano, espanhóis e portugueses, sendo a principal variável de crescimento.
Gráfico 3
Brasil: distribuição percentual da população por idade e sexo (1872 a 2010)
Fonte: Diretoria-Geral de Estatística DGE (DGE, 1872) e Censo Demográfico de 2010/IBGE. Obs.: Os dados de 1872 incluem a população escravizada. (CAMARANO, 2014, p. 88)
Gráfico 4
Brasil: população (em milhões) e taxa de crescimento (em %) (1872 a 1940)
Fonte: Merrick e Graham (CAMARANO, 2014, p. 85)
Gráfico 5
Brasil: taxa de crescimento da população (por habitantes mil) (1871 a 1940)
Fonte: Merrick e Gr
Graham (1981) (CAMARANO, 2014, p. 86)
- Fase 2: Queda da Taxa de Mortalidade (1940 – 1970)
Nesta fase, observa-se uma queda nas taxas de mortalidade e o declínio imigratório de italiano, espanhóis e portugueses. A queda na taxa de mortalidade foi sentida em todas as faixas etárias, mas com maior expressividade em recém-nascidos e crianças. A queda na mortalidade influenciou o ritmo de crescimento da população brasileira atingindo taxas médias anuais de 3%, principalmente entre os anos 50 e 60 e foi caracterizada como uma fase na queda da taxa de mortalidade.
Gráfico 8
Brasil: distribuição percentual da população por idade e sexo (1940 a 1970)
Fonte: Censos Demográficos de 1940 a 1970 / IBGE / (CAMARANO, 2014, p. 94)
Gráfico 6
Brasil: taxa de mortalidade infantil (TMI) e esperança de vida ao nascer (1940 a 2010)
Fonte: IBGE (1991b, 1999), Censos de 1980 a 2010/IBGE e Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) / Ministério da Saúde. Elaboração da autora Ana Amélia Camarano (Organizadora) (de 1980 a 2010) / (CAMARANO, 2014, p. 93)
- Fase 3: Queda do nível de fecundidade e natalidade (1970 – 2000)
Na terceira fase, observa-se uma queda dos níveis de fecundidade e natalidade combinado com a queda na mortalidade. Essa combinação influenciou diretamente a taxa de crescimento, reduzindo de forma acentuada para aproximadamente de 3% entre os anos 50 e 60 para a 1,6% a.a., o que representou uns queda de 47% em apenas 40 anos. Esta é uma fase foi marcada pela redução da fecundidade.
Gráfico 9
Brasil: distribuição percentual da população por idade e sexo (1970 a 2000)
Fonte: Censos Demográficos de 1970 e 2000 / IBGE / (CAMARANO, 2014, p. 93)
Gráfico 10
Brasil: população absoluta (por mil habitantes) e taxa de crescimento (%) (1970 a 2000)
Fonte: Censos Demográficos de 1970 e 2000 / IBGE / (CAMARANO, 2014, p. 98)
- Fase 4: Longevidade – Superenvelhecimento (2001 até hoje)
No final do século XX a fecundidade no Brasil chegou a níveis abaixo da reposição, ou seja, tem mais pessoas envelhecendo do que crianças nascendo, e com base nessa relação os mais velhos precisarão continuar produzindo para que o país por mais tempo. Bem, essa é quarta fase, caracterizada pela redução drástica da fecundidade e pelo se superenvelhecimento. Esse fenômeno caracterizado pela diminuição da população e consequentemente aumento de pessoas idosas são variáveis determinantes para mudanças profundas que vamos passar nos aspectos econômicos e sociais que trarão mudanças estruturais na forma como vivemos.
A transição demográfica é um dos mais extraordinários processos já ocorridos no mundo, com profundas mudanças no tamanho e na composição das famílias, no tempo médio de vida dos indivíduos e no crescimento e na estrutura etária das populações. Suas consequências são inequívocas, uma vez que as dinâmicas social e econômica não são neutras com relação a estas mudanças, pois são influenciadas tanto pelas transformações na composição populacional quanto pelos possíveis efeitos que o novo contexto demográfico pode exercer sobre o comportamento dos indivíduos e as decisões que tomam ao longo do seu ciclo de vida. Além disso, de uma maneira geral, esse processo não ocorre de forma isolada, sendo acompanhado por outras mudanças que são também muito significativas, tais como a transição epidemiológica, do mercado de trabalho e a educacional. (Cássio M. Turra, Presidente da Associação Brasileira de Estudos Populacionais)
Gráfico 11
Brasil: distribuição percentual da população por sexo e grupos de idade (2010 a 2050)
Fonte: Censo DemográGrafico de 2010 / IBGE / (CAMARANO, 2014, p. 187)
Elaboração da autora Ana Amélia Camarano (Organizadora)
Gráfico 12
Brasil: população (em mil habitantes) e taxa de crescimento do segmento com 60 anos ou mais (em %) (2010 a 2050)
Fonte: Censo Demográfico de 2010 / IBGE / (CAMARANO, 2014, p. 196)
Elaboração da autora Ana Amélia Camarano (Organizadora)
Em apenas quase 150 anos do primeiro censo no Brasil, observa-se que o envelhecimento da população está em ritmo acelerado, aliás não só no Brasil, no mundo. A grande característica do século XXI é o envelhecimento acelerado. Turra pontua muito bem que essa transição demográfica trará mudanças profundas na dinâmica social. Ainda não sabemos como será, mas temos alguns contornos dessa nova sociedade com impactos significativos no trabalho, educação, consumo, estilo de vida, etc, portanto, fica a dica, é preciso se preparar cada vez mais cedo.
Há um enorme desafio nessa caminhada que será desmistificar o estereótipo negativo sobre a velhice, ser idoso não é sinônimo de decadência, limitação ou incapacidade, ao menos que se esteja doente, mas doença não tem idade. Será um trabalho árduo para tirar esse preconceito dos ombros do “idoso”. O obstáculo não está no envelhecimento, mas na capacidade de se reinventar e, novamente, capacidade de se reinventar não tem a ver com idade, mas com autoconhecimento e a consciência de que é necessário buscar constante essa reinvenção todos os dias em todas as idades.
A antropóloga Kaufman (1986) que pesquisa o processo de envelhecimento há tempo, entrevistou 60 californianos, com idade entre 60 e 90 anos, em que cada um relata uma história única de vida sobre seus sentimentos e sobre a experiência de envelhecer. Conta que apesar do declínio do físico corporal, a maiorias deles mantém dentro de si mesmos um sentimento que ela denomina de the ageless self(o eu sem idade, do inglês).
Antropólogos têm apontado que, em todas as culturas, o envelhecimento biológico não é necessariamente igual ao envelhecimento social ou mesmo ao envelhecimento psicológico. Uma idade cronológica particular definida como velhice em uma cultura pode não ser considerada assim em outra. Da mesma forma, o comportamento definido por um grupo como inapropriado para os idosos, como ter relações sexuais ou usar roupas de cores mais chamativa, pode ser considerado bastante normal em outros. Além disso, a autopercepção e o envelhecimento psicológico frequentemente são independentes da idade cronológica. (HELMAN, 2009, p. 19).
Bem-vindo ao the ageless self, ou se preferir, ao “eu sem idade”, sem estereótipos e sem rótulos para faixa etária que “caracterizava o idoso no Brasil”. A identidade é mais social do cronológica, não porque a idade seja ruim, mas porque ela não define nada. O que defini são nossas atitudes diante dos desafios da vida. Dê menos relevância à idade e tenha mais atitude, busque se reinventar e viver a vida de forma plena e integral, não veja a vida como algo a temer, mas para viver.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
CAMARANO, A. A. (Org.). Novo regime demográfico: uma nova relação entre população e desenvolvimento.Rio de Janeiro: Ipea, 2014.
GOLDENBERG, M. A bela velhice. Edição 5: Rio de Janeiro e São Paulo: Record, 2014.
HELMAN, C. G. Cultura, Saúde e Doença. Edição 5ª: Porto Alegre, Artmed, 2009.
KAUFMAN, S. R. The Ageless Self: Sources of Meaning in Late Life. Madison. London, Wis.: University of Wisconsin Press, 1986.
Tabelas de Projeção da População do Brasil por sexo e idade: 2000-2060. Disponível em:<https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/projecao_da_populacao/2013/default_tab.shtm>. Acesso em: 12 out. 2018.
UNITED NATIONS ORGANIZATION. Department of Economic and Social Affairs, Population Division (2017). World Population Prospects The 2017 Revision: Key Findings and Advance Tables. Paper No. ESA/P/WP/248.
2018: WORLD POPULATIO DATA. Disponível em http://www.worldpopdata.org/. Acesso em: 24 set. 2018.
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Mousar Casanova
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