Exigência de mobilidade do aplicativo se tornou uma ferramenta importante no estímulo de crianças internadas e pessoas com autismo
Por Danilo Moreira
Lançado mundialmente em julho e desde o dia 3 de agosto no Brasil, Pokémon Go se tornou um fenômeno que ganhou milhões de adeptos de todas as idades. O jogo para smartphones Android e iOS utiliza o recurso da realidade aumentada e GPS para que o usuário (ou, conforme é chamado no jogo, o treinador de pokémons) possa capturar os famosos monstrinhos, que fizeram sucesso na televisão brasileira com o desenho japonês de mesmo nome no final dos anos 1990. Tal formato torna o game interessante e inovador por estimular o usuário a se locomover para capturar as criaturinhas.
Justamente por incentivar que o jogador saia por aí com o celular na mão, o jogo tem sido alvo de polêmica, já que dependendo da insegurança do local e da responsabilidade do usuário, este pode estar exposto a riscos e acidentes. Mas enquanto há pessoas que criticam, outras utilizam o game de forma criativa para finalidades importantes. Exemplo disso é o que acontece no hospital C.S. Mott Children’s, sediada em Ann Arbor, cidade do Estado de Michigan (EUA). Lá, crianças que estão internadas têm encontrado no jogo um estímulo importante para saírem dos seus leitos na busca dos bichos virtuais. O objetivo é incentivar os pequenos a interagirem entre si, além de se divertirem enquanto realizam seus tratamentos e encaram a pesada rotina de internação em um ambiente hospitalar.
Segundo o gerente de mídia digital do hospital e especialista em vida infantil, J.J. Bouchard, o jogo estimulou a comunicação dos pacientes e mudou a rotina do local. Ele também conta que os pequenos têm interagido bastante e se ajudam na captura de pokémons, além de tirarem fotos uns dos outros com as criaturinhas (no game, é possível você fazer selfies com os animais). “É uma forma divertida de incentivar a mobilidade dos pacientes. Este aplicativo está sendo capaz de tirar as crianças da cama e fazê-las andarem”, explica, em entrevista ao USA Today. O médico afirma que o centro possui PokéStops (locais que os jogadores abastecem-se de pokébolas para continuar caçando pokémons) e um ginásio Pokémon (onde os treinadores usam os monstrinhos para duelar com o de outros treinadores) localizado em uma estátua de Big Bird.
Jennifer Griggs é mãe do pequeno Braylon, de 11 anos, que está no hospital tratando um tumor cerebral. Ela afirma que baixou recentemente o aplicativo e passou a jogá-lo no centro. já observando melhorias no filho. “Nós achamos que seria bom tentar tirá-lo do quarto, porque é um pouco deprimente ficar no hospital por tempo prolongado”, afirma.
De acordo com informações do jornal O Globo, apesar do elogio de pacientes pelo uso do game, outros hospitais da região têm reclamado de visitantes que vão a esses endereços apenas para jogar. Mas Bouchard afirma que o hospital infantil americano está ciente dos riscos e até o momento não teve incidentes. Ele explica que o local deixa avisos para que os jogadores não acabem tirando fotos dos pacientes enquanto fotografam pokémons ao capturá-los, e afirma que até o momento não foi registrado incidentes desta natureza.
Estímulo para autistas
Uma das características do autismo é a dificuldade de interação social e comunicação. Recentemente, alguns veículos do mundo têm noticiado casos na qual o uso do Pokémon Go tem auxiliado a vida de pessoas autistas. Um exemplo é o caso britânico Adam Barkworth, de 17 anos. O jovem não conseguia sair na rua por conta dos barulhos e pessoas que falavam alto, chegando a sentir tremedeira e dores de estômago. Isso fez com que o rapaz permanecesse o tempo todo em casa, entretido no game de guerra Minecraft. A mãe Jan Barkworth relata que o jogo tem estimulado o adolescente passar horas fora do lar em busca dos animais virtuais, além de buscar maior interação com as pessoas.
Outro caso é o de Ian Thayer, de 12 anos, que também melhorou sua capacidade de socialização por meio do game. Em entrevista à CNN, a mãe Stephanie Barnhill conta que o menino, que tem Síndrome de Asperger, começou a capturar pokémons em casa, mas, logo teve a iniciativa de sair e interagir com outras crianças de sua comunidade. “Ele não é o tipo de criança que sai para brincar. Mas esse jogo permitiu que ele quisesse se comunicar com as pessoas e começar conversas sobre as criaturas que ele capturou”, relata.
Já Leonore Koppelman é mãe de Ralphie, de seis anos, que é autista e possui hiperlexia – síndrome na qual um dos sintomas é a dificuldade em lidar com a linguagem oral e, consequentemente, dificuldades de socialização. Leonore afirma que o jogo também ajudou o filho na interação com outras crianças e até mesmo a diminuir preconceitos. “Elas querem jogar Pokémon Go, e ele também, então isso dá a eles algo em comum para fazer. As crianças estão tão focadas em pegar pokémons que elas se concentram mais em encontrá-los do que no comportamento dele”, conta à CNN.
Opiniões de especialistas
Na Austrália, alunos com necessidades especiais passaram a receber incentivos para jogar Pokémon Go dentro e fora das salas de aula. Em entrevista ao jornal britânico The Independent, o professor e investigador especialista em autismo Craig Smith afirma que o aplicativo tem dado confiança às crianças para superarem as suas dificuldades sociais. O docente explica que com a grande repercussão do game, os pequenos são estimulados a se encorajarem mutuamente e a participarem de atividades em grupo por meio do aplicativo. Smith acredita que o game pode ser utilizado nas escolas de modo geral como uma ferramenta de aprendizagem. “O jogo pode ser usado como revista ambulante na qual os alunos são convidados a seguirem uma história ou um mapa, e isso vai ajudá-los a desenvolver competências como a criatividade e até mesmo melhorar as suas habilidades matemáticas", afirma Smith.
A psicóloga e especialista em Criatividade Cleusa Sakamoto afirma que o jogo reintroduziu o brincar no cotidiano. “Tem uma importância imensurável, porque a criança se desenvolve, comunica, explora o mundo e aprende por meio de suas atividades lúdicas. É como dizem os especialistas em Educação e Infância, ‘brincar é coisa séria’”, comenta.
Já o pesquisador do Centro de Estudos Infantis da Universidade Yale (EUA), Dr. Fred Volkmar, alerta que é necessário que exista um monitoramento dos responsáveis sobre o uso do jogo. Ele afirma que as crianças podem jogar até o ponto que isso possa interferir no aprendizado sobre o mundo. “Se você consegue manter a atividade de forma funcional, tudo bem. É prejudicial se esta é a única coisa em que eles estão interessados. Se ajudar a criança a se isolar ainda mais, não é bom”, diz o especialista à CNN.
Mesmo com polêmicas, o fato é que, o game é um fenômeno mundial que tem promovido novas formas de interação com o ambiente, abrangendo jogadores de todas as idades. O sucesso do Pokémon Go tem despertado o interesse de pesquisadores e levado a estudos sobre suas possibilidades de utilização em áreas como Saúde e Educação. Como o game une o real e o virtual em uma experiência nova para muitos usuários de smartphone, especialistas em mercado e tecnologia apontam que este formato abre novas possibilidades de produtos inovadores para o segmento de games e outros ramos empresariais.
Fontes: Hypeness, Gazeta On-line, O Globo, TVI, UOL, Hypescience, CNN